Nota técnica do Instituto Unibanco
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Em 2022, foi lançado o Centro de Evidências da Educação Integral, apoiado pelos institutos Natura e Sonho Grande, com o objetivo de sistematizar e gerar conhecimento sobre educação integral. Na ocasião, foram apresentados os resultados preliminares de uma pesquisa que estima os impactos da educação integral de médio e longo prazo no Brasil. Essa pesquisa envolveu o levantamento e a sistematização de estudos nacionais e internacionais, inclusive de alguns citados anteriormente, e avaliações de impacto.
Hoje, além de ações de segurança para combater a violência, é preciso enfrentar aquilo que nos deixa paralisados e nos impede de ensinar e aprender: o medo. Vamos reunir aqueles que acreditam na educação para construir espaços de diálogo, de escuta e de disseminação de informações confiáveis. Compartilhando o que todos e cada um tem de mais potente para resgatar o ambiente de paz nas escolas.
o Fluxo, que é a taxa de rendimento escolar (aprovação) e o Aprendizado que considera as médias de desempenho nos exames aplicados pelo Inep.
Vamos ver o que podemos inferir?
Primeiro precisamos olhar se o fluxo melhorou ou piorou. E, para uma análise mais completa, precisamos olhar também para evolução do número de matrículas.
Possível continuação da aprovação automática ou sucesso de inclusão e correção de fluxo
Possível exclusão. E ficaram ou menos vulneráveis, que avançam
Possível exclusão com retenção
Volta à normalidade, sem aprovação automática
Para entender de maneira mais clara se resultado melhorou ou piorou é preciso olhar para dois outros indicadores: a taxa de participação e o número de matrículas
Se ela é alta temos resultados mais condizentes com a realidade. No entanto, se a participação é baixa, o resultado pode ser mais distante do real
Olhando os resultados no número de matrículas podemos inferir duas conclusões. Matrículas em alta, significam maior inclusão, matrículas em baixa indicam maior exclusão
Aprendizado melhor, com participação na prova e ainda provável processo inclusivo
Algum processo de exclusão pode ter ocorrido e só os que ficaram são menos vulneráveis e que fizeram a prova
Inclusão, mas sem incentivo à realização da prova. É preciso ver resultado com mais cuidado
Exclusão com desincentivo à prova. Menos alunos no sistema e pouco fazendo a prova.
Inclusão, mas sem incentivo à realização da prova. É Preciso ver resultado com mais cuidado
Com inclusão e incentivo à prova é natural queda de desempenho. Atenção ao pedagógico.
Mais inclusão, mas com desincentivo à prova. Não consegue ver o real impacto
Exclusão e desincentivo à realização da prova
Entre as experiências analisadas está a do Ensino Médio Integral em Tempo Integral (EMITI) em Santa Catarina (SC). Nessa avaliação, 24 escolas foram divididas em dois grupos – com e sem educação em tempo integral – e observadas ao longo de dois anos. A análise dos resultados foi extrapolada para três anos para permitir a comparação do desempenho dos alunos. De acordo com Ricardo Paes de Barros, coordenador geral do Centro:
O impacto da educação integral foi um aumento de 20 pontos na escala de proficiência do Saeb, ou seja, o equivalente a tudo que se aprende no Ensino Médio. Podemos então dizer que, com a educação em tempo integral, o aprendizado dos alunos dobra em comparação com o aprendizado dos alunos do ensino regular.
O estudo aponta ainda que, em termos monetários, esse aumento de 20 pontos na escala do Saeb pode significar, para os jovens que cursam o Ensino Médio em tempo integral, um acréscimo de 10% na remuneração do trabalho ao longo de toda a vida.
Além desse ganho decorrente do aumento de aprendizado, há também os benefícios resultantes da maior chance de o aluno em tempo integral concluir a Educação Básica e a educação superior. Com isso, o ganho total na remuneração pode chegar a 15%, de acordo com o estudo.
A avaliação também mapeou os benefícios gerados para a sociedade. No total, estima-se que o valor dos ganhos em geração de renda para cada jovem estudante adicional que tenha acesso a uma educação integral no Ensino Médio é de 145 mil reais. Uma vez que o custo para assegurar uma educação integral a esse jovem é de cerca de 24 mil reais, a conclusão dos pesquisadores é que os benefícios individuais e sociais com a educação integral representam seis vezes o seu custo. “Qualquer que seja a conta que se faça, educação vale a pena. Educação integral significa mais educação de qualidade na vida das pessoas. E mais educação de qualidade na vida das pessoas é sempre um bom negócio”, afirmou Paes de Barros.
Desafios
Entre os principais desafios da oferta de educação integral está, certamente, o investimento financeiro. Estima-se que uma escola em tempo integral precise de, pelo menos, o dobro do investimento que uma escola regular. Entre os custos adicionais estão adaptação de escolas, mais refeições diárias, contratação e capacitação de um maior número de profissionais e aquisição de materiais adicionais.
Renê Silva, em artigo para o Centro de Referências em Educação Integral, destaca, especialmente, dois fatores que precisam ser levados em consideração no que se refere ao investimento financeiro: a extensão territorial dos municípios, que tem impacto nos recursos necessários para manutenção da rede, e o nível de formação dos professores, que repercute nos recursos necessários para pagamento salarial. De acordo com Silva, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) não leva em consideração esses dois fatores no repasse de seus recursos, o que não contribui para a diminuição das desigualdades socioeducacionais:
Mesmo na atual configuração, os recursos destinados pelo fundo para a ampliação de tempo dos estudantes não cobrem os investimentos necessários, uma vez que preveem apenas um aporte de 30% a mais por estudante que for matriculado como estudante de educação integral. O fator de ponderação de 1,3 passa longe de considerar as verdadeiras necessidades de investimento para a educação integral. Não há lógica que justifique a manutenção do cálculo desse fator de ponderação, que minimamente deveria ser 2.
Além da necessidade de contratação de profissionais para dar conta do período integral, também há a questão da formação desses profissionais. De acordo com Gabriela Moriconi, pesquisadora do Departamento de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas:
A maioria das escolas contrata professores em tempo parcial, muitas vezes vistos como fornecedores de aula. Dessa maneira, é muito difícil conhecer os estudantes e fazer um planejamento adequado. [...] Esses professores precisam ter bastante repertório e experiência para vivenciar o que vão fazer lá na frente. Sem isso, vai ser muito difícil formar um professor com essa visão mais ampla para formar o aluno integralmente.
Em seu artigo, Silva também destaca que mais horas na escola,
além de exigir a ampliação de carga horária de profissionais que já estão atuando, também exige a contratação de novos profissionais, sobretudo que atuam no campo das artes, da cultura popular, da música, das atividades corporais e esportivas, das tecnologias da informação e de campos diversos das ciências.
E, junto com todas as contratações, vem também o desafio da remuneração digna e adequada e os diferentes tipos de contratação que são oferecidos para esses profissionais.
Para ele, a curto prazo, a formação continuada dos professores também é estratégica e urgente, não somente para os novos, mas para todos os profissionais da escola:
Precisamos de uma política de formação continuada que potencialize o papel formador da coordenação pedagógica da escola quanto às questões do campo do planejamento, da didática, das metodologias e da avaliação, e que também possibilite o aprofundamento de estudos sobre as especificidades da educação integral e as especificidades de cada área do conhecimento.
As pesquisas de Julia Dietrich, citadas anteriormente, também apontam para o desafio pedagógico e demais fatores estruturantes. Segundo a pesquisadora, o tempo importa, mas só se condicionado a fatores como: infraestrutura escolar, rede de atenção ou proteção ao estudante e fatores pedagógicos, como formação docente inicial e continuada e retroalimentação de práticas, com coordenação pedagógica atuante e espaços de diálogo e acompanhamento da atividade dos professores em sala de aula. Quando esses fatores não estão condicionados, mais tempo na escola pode, inclusive, ser prejudicial à proficiência. Ela aponta também para a importância de se olhar o modelo com cuidado para que ele, contrariamente ao seu potencial de combater as desigualdades, não ajude a aprofundá-las:
Mais tempo na escola tende a beneficiar todas as camadas sociais, porém os menos vulneráveis (e mais ricos) se beneficiam mais, criando possíveis ilhas de excelência. Essas escolas, comumente, estão em territórios menos violentos, possuem maior infraestrutura e têm menor rotatividade de professores(as) e maiores oportunidades de formação docente. Ao mesmo tempo, as e os estudantes apresentam em seus contextos familiares e de vida externa à escola maiores oportunidades para acessar diferentes repertórios culturais, linguagens e conhecimentos.
Corroborando essa reflexão, uma pesquisa do Cenpec mostrou que a implementação de educação integral que não considera progressivamente toda a rede ou não prioriza escolas mais vulneráveis acirra as iniquidades. Anna Helena Altenfelder, presidente do Conselho de Administração do Cenpec, explica os motivos:
Isso acontece porque acabam indo para as escolas de educação integral os estudantes com mais recursos sociais, culturais e econômicos, bem como professores com maior formação e tempo de carreira, e isso precariza as escolas do entorno, com alunos que sofrem com a cultura do fracasso escolar. Então é preciso um cuidado importante da gestão para olhar o todo da rede. A política de educação integral tem o potencial de combate das desigualdades e deve existir por isso, mas não pode virar política de exclusão.
Entre os desafios do dia a dia da educação integral também está tornar o ambiente da escola mais interessante, acolhedor e que atenda às especificidades dos alunos. Nesse sentido, Silva fala sobre a importância de, antes de se ampliar o currículo, dialogar com estudantes e seus familiares, assim como com os professores, para que eles participem da construção da proposta, desejem as mudanças, entendam a nova dinâmica e se encantem por ela:
Não basta dizer que a escola passará a funcionar dois turnos e dizer que isso é bom para os estudantes, pois nesse espaço educativo temos várias realidades, e com o diálogo, a gente vai percebendo que o que a gente acha que é bom para todo mundo nem sempre pode ser. A vida dos estudantes não é apenas a escola. Muitas vezes ela se coloca como se fosse a centralidade da vida deles, como se esse estudante não tivesse vida fora da escola. Em razão das diferentes realidades de vida que ali se encontram, é preciso muita sensibilidade para acolher essas diferenças.
Um exemplo de iniciativa que se mostrou eficiente nesse sentido foi destacado pela diretora Antônia da Silva Lima e pela professora Daisy Samara, do C.E.T.I. São João Batista, de São João da Fronteira (PI), que desde 2014 oferece educação em tempo integral. A escola, diante do desafio de ampliação da carga horária, propôs um espaço às segundas-feiras no qual os estudantes são recebidos com mensagens acolhedoras preparadas por cada turma sob a orientação de um professor. Essas mensagens dispararam importantes conversas sobre temas que fazem sentido para os alunos – uma vez que são propostos e escolhidos em comum acordo por eles mesmos. A iniciativa contribuiu para a redução do índice de evasão dos alunos de 14,8%, em 2010, para 4,24% em 2017.
Além da questão do interesse e do protagonismo do jovem, também há a necessidade de promover políticas públicas que viabilizem a permanência na escola, como programas de bolsas, especialmente para aqueles de período integral no Ensino Médio, pois muitos jovens precisam trabalhar para ajudar a compor a renda familiar. No Brasil, cerca de 20% dos estudantes não terminam a Educação Básica por necessidade de trabalho, dificuldade de aprendizado, falta de interesse ou gravidez na adolescência. Um estudo do Insper aponta que pagar para os alunos se manterem na escola durante o Ensino Médio pode reduzir em 7 pontos percentuais, em média, a evasão de jovens.
Pensar a educação integral no Brasil, assim como as políticas para a área, requer importantes cuidados, especialmente com as profundas desigualdades existentes entre as redes de ensino e, inclusive, dentro de uma mesma rede. Investimento financeiro, vontade política e coordenação do governo federal são fatores muito importantes para impulsionar essa modalidade, mas ela certamente demandará projetos customizados e capazes de envolver e dar protagonismo aos principais atores responsáveis por sua implementação na ponta: escolas, professores e alunos.